sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Quadrinhos e literatura

Quadrinho é arte? É literatura? De vez em quando surgem comparações e questionamentos assim. Que é arte, ninguém duvida. Tem até classificação oficial. Numa das postagens anteriores desse blog, no curta-metragem História em Quadrinhos bem no finalzinho ta lá: A História em Quadrinhos reivindica para si o título de oitava arte do século. Hoje sabemos que os quadrinhos perderam o título para a fotografia, mas a nona arte é dos quadrinhos. Independente de qualquer oficialização basta entrar no clima, ler os grandes clássicos e conhecer os novos talentos pra descobrir se quadrinhos é arte. Talvez o que atrapalhe seja o enorme preconceito ainda existente em relação à linguagem, associando a coisas de crianças. E literatura? Bem, acho que são coisas distintas, com especificidades próprias de cada linguagem. Mas a relação existe e é muito forte. Em comum à utilização da escrita e do suporte gráfico, mas a semelhança para por aí. Alguns autores preferem utilizar pouco à escrita, tornando a linguagem dos quadrinhos ainda mais universal. É o caso de Carl Anderson que desenhava seu personagem Pinduca até sem boca, ou Otto Soglow e seu Reizinho, ou ainda Peter Kuper com Spy X Spy, que aboliu totalmente os diálogos escritos. Na literatura a imagem forma-se pelas palavras, enquanto nos quadrinhos ela vem associada ao desenho para tomar sentido. Daí a necessidade de “aprender” a ler quadrinhos para gostar. Se antes era visto como pernicioso à formação da criança, hoje se sabe que é justamente o contrário. Criança que lê quadrinhos será um leitor para sempre...e leitor de qualquer texto. Fato emblemático foi à recente entrada de Mauricio de Sousa para a Academia Paulista de Letras. É o reconhecimento, por parte dos acadêmicos, da importância que seu trabalho teve na formação de milhares de novos leitores. Outro dado relevante é a participação de quadrinistas na Flip, o maior evento de literatura realizado no país. Na edição de 2010 estiveram presentes Robert Crumb e Gilbert Shelton e nesse ano Joe Sacco. Os maiores roteiristas de quadrinhos vem, naturalmente, da literatura. É o caso de Dashiell Hammet, roteirista do Agente Secreto X-9, desenhado por Alex Raymond. Dashiel é autor de O Falcão Maltes e de inúmeros roteiros para cinema. No Brasil tem Lourenço Mutarelli, que também é ótimo desenhista, mas que aos poucos deixa de fazer quadrinhos para dedicar-se a literatura (é o que parece). Sem esquecer de R. F. Lucchetti, uma dos escritores mais profícuo que conheço (escreveu mais de mil livros). É comum a versão em quadrinhos de obras literárias. E isso não vem de agora. Nas décadas de quarenta e cinqüenta as adaptações dos clássicos da literatura universal e brasileira eram bastante aceitas pelo público e muitas séries surgiram, principalmente publicadas pela editora Brasil-América, mais conhecida como EBAL, de Adolfo Aizen. Novo impulso veio a partir de 2006 quando o Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE), que procura incentivar o hábito da leitura em estudantes de escolas públicas do ensino fundamental e médio, do Governo Federal, incluiu histórias em quadrinhos, de cunho educativo, no acervo que distribui a estabelecimentos de ensino de todo o País. As críticas vieram juntas – muitos questionavam a qualidade dessas adaptações. Em minha opinião o que torna uma adaptação chata é quando o autor tenta torna-la “pedagógica” e abre mão do principal: a linguagem própria do quadrinho. Ilustrar um texto com desenhos é uma coisa, “quadrinizar” é outra. Lembrando que nunca haverá tradução fiel ao texto, fato que acontece em qualquer transposição de linguagem, mas uma boa adaptação desperta sim a curiosidade para procurar ler o original, principalmente em jovens e crianças. É como assistir um filme relativo à matéria que se esta estudando: motiva; apresenta novos pontos de vista; diverte. Penso que aprender envolva todos os sentidos. No Garatuja há vários gibis que são adaptações da literatura: Contos do beatnik Charles Bukowski, desenhado pelo alemão Mathias Schultheiss; David Copperfield, de Charles Dickens publicação de 1960 pela Edição Maravilhosa e o brasileiro Ubirajara, de José de Alencar quadrinizado pelo português José Ruy. Como destaque três clássicos da literatura, com ótimas adaptações. A Ilha do Tesouro, de Robert Louis Steverson, desenhado por Hugo Pratt. A Ilha do Tesouro é uma história de piratas e corsários, escrita no século XIX, matriz do estereótipo “perna de pau e papagaio no ombro” que já empolgou muitos jovens do passado antes da febre de Piratas do Caribe e seu galã Johnny Depp. O desenhista Hugo Pratt, que já morou em São Paulo, tem uma narrativa muito próxima ao cinema, com uma fluência incrível. Depois que se começa a ler é impossível parar no meio. Outro clássico da literatura adaptado aos quadrinhos que temos no Garatuja é O Alienista. Seu autor, Machado de Assis, é considerado o maior escritor brasileiro de todos os tempos e nessa história conta as desventuras de Simão Bacamarte, um médico psiquiatra que funda um manicômio e acaba internando todo mundo na pequena Vila de Itaguaí. A adaptação é dos aclamados gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá. Com essa história eles ganharam a 500 Prêmio Jabuti de Literatura na categoria. Outro clássico do acervo é A Metamorfose, de Franz Kafka, na adaptação de Peter Kuper, citado acima como desenhista de Spy X Spy, criação de Antonio Prohías. Em Metamorfose, Kafka narra o estranhamento do jovem Gregor Samsa ao acordar e perceber que virou uma barata. Abaixo o vídeo La Metamorfosis, que achei na internet. Nada a ver com quadrinhos, mas não resisti em posta-lo uma vez que falei de boas adaptações. Veja o vídeo, leia o gibi e não leia o livro se for capaz!





terça-feira, 12 de julho de 2011

O Homem que Hipnotizava

A História em Quadrinhos aqui postada foi feita em 2005. Lembro-me da primeira vez em que peguei o telefone para ligar para o André Carneiro pedindo autorização para transformar seu conto em quadrinhos. Não o conhecia pessoalmente. André Carneiro era uma espécie de mito para mim. Desde muito jovem ouvia falar de seu talento e, principalmente, de sua inteligência. A primeira pessoa que me falou dessas qualidades foi meu pai, que o conhecia desde os tempos da Loja Recaredo (A Loja Recaredo pertencia ao pai do André e comercializava ferragens e ferramentas em Atibaia nos anos 50). Com o tempo fui conhecendo melhor seu trabalho e minha admiração aumentou muito. Penso que algumas histórias que ouvia ajudaram a alimentar essa ideia mítica a seu respeito. Uma delas era com respeito a casa onde morava: diziam conter compartimentos secretos, ou esconderijos, que usou no período da ditadura militar. Outra história era de que o André era hipnotizador, e realizava sessões com esse objetivo. Esses fatos instigaram minha infância e provavelmente influíram em minha ideia a seu respeito. André Carneiro é sem dúvida o maior artista que Atibaia já teve. Basta acionar o google para saber da abrangência de sua obra, e não só na literatura, onde além de poeta é um dos precursores da ficção cientifica no Brasil, mas nas artes plásticas, na fotografia e no cinema. Apesar de todas essas qualidades, André Carneiro é bastante acessível e tornou-se um amigo de que muito me orgulho. Quanto à história em quadrinhos, durante certo tempo trocamos e-mails e numa delas ele disse:”...Quanto ao seu desenho, incluindo a técnica, a expressividade, o jogo de equilíbrio estético em geral, posso afirmar sem favor que tem nível internacional. Isso é o mais importante. Você tem a "posse do instrumento", sabe pintar, como diria o Sérgio Milliet. Se um roteiro diz "mulher bonita" você desenha uma jovem bonita, o que pode parecer óbvio a um leigo, mas é uma raridade em uma banda desenhada. Retirei um roteiro de uma Editora porque o desenhista não sabia desenhar um nu. Ingênuos tentam pintar quadros abstratos ou cubistas, com a ilusão que são mais fáceis. Mas nenhuma "tapeação" semelhante o quadrinho permite. O sintetismo dele exige desenhista de categoria, como também a xilogravura para um gravador. Não há como enganar com rabiscos ou sombras. Por isso um roteiro meu que a Ruth Rocha tinha aprovado para uma nova revista da Abril (que não saiu) ela perguntou se eu faria, pelo menos um primeiro tratamento. Não fiz, não era e não sou capaz. Daria para você, mas não o conhecia na época”. Além de O Homem que Hipnotizava, também fiz um esboço do conto A Espingarda, tendo a sugestão do autor em determinadas ocasiões. As histórias não estão finalizadas. Trata-se apenas de um estudo preliminar. Essa primeira versão pintei com gouache e lápis de côr, mas pretendo melhorá-la utilizando modelo ou referência fotográfica assim que conseguir apoio, ou patrocínio, para editá-la. Afinal a responsabilidade é grande e viabilizar esse projeto é questão de honra. Para facilitar a leitura click na imagem.

PS - Depois que postei essa matéria, mandei um e-mail ao André comunicando o fato. Ele gentilmente respondeu:

Carissimo Zago
Voce, como eu já disse algumas vezes, é um legitimo artista colocando Atibaia na liderança de realizações artísticas. Os seus trabalhos, que estão pendurados em minha sala, sempre mostro a pessoas interessadas. Fiquei muito feliz de voce finaliza-las e me dizer que está com intenções de publica-las. Fico na torcida para que possa concretizar esse projeto brevemente. Seria absolutamente justo que os órgãos públicos apoiassem suas idéias. Fiquei muito honrado também com os elogios do seu texto, são manifestações desse tipo que dão força e alimentam a continuidade da nossa atuação.

Grande Abraço
ANDRÉ
ps - Um abraço para a Elsie, outra batalhadora incansável da cultura ao seu lado






















































































segunda-feira, 11 de julho de 2011

Revista Garatuja Quadrinhos no 1

por Márcio Zago

A revista postada abaixo foi resultado de uma oficina de História em Quadrinhos realizada em 2006. Ao todo foram vinte jovens atendidos, por um período de três meses. Apesar do pouco tempo (somente uma aula por semana), foi possível executar um projeto em que os participantes passassem por todas as etapas de realização de um gibi. O projeto chamou-se Da nossa História aos Quadrinhos, onde a proposta era criar histórias voltadas a nossa realidade. A oficina começou com aulas teóricas sobre a linguagem dos quadrinhos e disponibilização do acervo de gibis do Garatuja para consulta dos participantes. Depois vieram roteiro, desenvolvimento do personagens e diagramação na página. A arte final foi feita com bico de pena ou canetinha nanquim. Alguns usaram o computador para colorir, outros pintaram a mão. Aconteceram também visitas monitoradas a gráfica que imprimiu a revista, onde os amigos Marcelo Mitt e Patrícia demonstraram aos jovens as etapas utilizadas no sistema de impressão offset. A oficina foi realizada através da ASSAOC e das Oficinas Culturais, patrocinadas pela Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo. A impressão da revista foi patrocinada pela Prefeitura da Estância de Atibaia que distribuiu-as aos alunos das escolas municipais. Segue o texto que escrevi para a apresentação da revista:
Da nossa história aos quadrinhos.
Diferente das demais artes, a História em Quadrinhos não teve sua origem ou desenvolvimento associado à cultura burguesa. Pelo contrário, desde seu surgimento - que os americanos juram ser em 1895 com The Yellow Kid – ou mesmo antes disso, quando a linguagem apenas se esboçava, as narrativas quadrinizadas sempre foram dirigidas às camadas mais simples da população. Seu texto sucinto, e desenhos facilmente compreendidos, tendendo ao humor, acertaram em cheio no gosto popular. Bastou o empurrãozinho de dois magnatas americanos, ligados ao jornalismo, com excelente faro para transformar tudo em dinheiro, e estava criada uma das maiores indústrias de entretenimento que se tem notícia. Embora chamada de Nona Arte a História em Quadrinhos nunca foi levada muito a sério, principalmente pela elite intelectualizada. Essa associação com o cômico (comix), e a estreita ligação com a cultura de massa talvez seja a causa dessa indiferença em relação às outras artes, ditas mais nobres, como pintura, escultura, etc. Lógico que mantendo as especificidades da linguagem, o quadrinho já deu artistas a altura de Rodin, Caravagio ou Picasso, aliás, Picasso era um apreciador confesso das aventuras de Winnie Winkle. Na década de trinta, na chamada época de ouro dos quadrinhos, surge uma geração de autores buscando novas possibilidades estéticas e qualidade na narrativa. Para eles quadrinho não eram apenas humor e entretenimento. Surgem clássicos como Flash Gordon, Dick Tracy , Príncipe Valente, O agente X-9, desenhistas como Hall Foster, Alex Raymond, Milton Caniff, e roteiristas como Dashiell Hammett e Al Capp. O quadrinho nunca mais seria o mesmo. De lá pra cá uma infinidade de autores, desenhistas e personagens surgiram, e a maioria deles desconhecidas do grande público. Vale a pena citar: Tintin de Hergé; Spirit de Will Eisner; Moebius; Guido Grepax; Robert Crumb; Corto Maltese de Hugo Pratt; Frank Miller; Neil Gaiman; Alan Moore; Drunna; Milo Namara e os brasileiros Ziraldo (Pererê); Flávi Colin; Jayme Cortez; Jô Oliveira; Lourenço Mutarelli e outros. Agora temos a influencia oriental dos mangas.  E aí começa uma outra história... ao divulgar a realização dessa oficina, aberta aos interessados em quadrinhos, a grande parcela das inscrições eram voltadas ao mangá. De desenvolvimento paralelo ao quadrinho ocidental, o mangá tem sua origem mais remota também como uma necessidade de expressão narrativo-figurativas, sendo cunhado mangá através da arte xilográfica do Ukiyo-ê, no trabalho de Hokusai, recebendo mais tarde influências dos quadrinhos americanos no fim do século XIX e início do século XX, transformando-se num grande filão comercial no Japão de hoje, alavancados pelas atividades paralelas como os animês, garage kit, cosplays, vídeo-games, trilhas sonoras, merchandising, etc. Recentemente a produção japonesa volta-se para o ocidente, arrebatando milhões de apreciadores e ganhando no Brasil proporções gigantescas. Fenômeno pouco estudado, o Mangá caracteriza-se por histórias com enredos quilométricos, as chamadas sagas, com temáticas puramente ligadas à cultura japonesa, e estética própria, caracterizadas pelos personagens de olhos grandes e brilhantes lançadas pelo desenhista Tezuka Osamu. De leitura rápida, muito em função dos ideogramas, o mangá que é editado no Japão, mais se assemelha a enormes listas telefônicas, impresso em papel jornal a um custo muito baixo. Aí está, a meu ver, a primeira qualidade dos Mangás. As histórias são enormes, com muitas páginas e muitos desenhos. Para quem enfrenta como eu, dificuldade em conseguir a tão sonhada elaboração e acabamento em trabalhos, principalmente feitos por jovens, deparar com roteiros enormes, cheios de fantasia e citações históricas, é no mínimo, animador, sem contar na qualidade dos desenhos, que obviamente vem da quantidade. Para essa revista, como denota o próprio espírito de oficina, tem de tudo: da história tipicamente feminina pela forma e conteúdo; até a temática existencialista e violenta mais presente no universo masculino, passando pelo humor, pelo imaginário popular das lendas brasileiras, pela situação urbana e rural, pela aventura quase cinematográfica, pelo religioso e pelo fúnebre. São reflexos da alma de nossos jovens, que devolvem, através de recados muito claros, anseios e esperanças. Particularmente, depois de cada oficina, onde por breve período convivo com eles, sinto-me revitalizado. Apesar da triste realidade apresentada pelo mundo adulto, os jovens trazem em si a viabilidade da existência, expressa a cada momento, pois ainda mantém nossa mais importante fonte de vitalidade: o sonho humano. 

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Gustave Verbeek, um quadrinista de cabeça para baixo.

Determinados artistas, por sua incrível capacidade criativa, extrapolam qualquer classificação dentro dos movimentos da arte. É o caso do pintor italiano Giuseppe Arcimboldo, que viveu no século XVI. Seu trabalho é “estranho” até hoje. Quem nunca viu aquelas imagens de fisionomias humanas formadas por frutas, flores, legumes? Esse estranhamento fez com que Arcimbordo ficasse esquecido por muitos anos. Escher é outro. Esse artista holandês, que morreu em 1972, também criava imagens inusitadas gerando figuras com efeitos de ilusões de óptica. Escher utilizou de todos os recursos possíveis do plano bidimensional para criar efeitos de planos tridimensionais impossíveis de acontecer: um córrego em que a água caminha em circulo, com quedas e correntezas...mas só desce; um labirinto de escadas que se entrecruzam embaralhando a lógica da imagem, e outros. Nos quadrinhos o jogo visual existe desde sua origem. Pat Sullivan, já no começo do século XX, brincava com tiradas gráficas do Gato Félix. Pinduca, de Carl Anderson explorava as imagem, utilizando pouco texto para contar suas histórias e Little King, ou O Reizinho no Brasil, de Otto Soglow também sempre se reportou as gags visuais e a economia das palavras. Mas o trabalho realmente inusitado nos quadrinhos é de Gustave Verbeek. Ele é o criador da incrível façanha de publicar durante dois anos histórias em quadrinhos que podiam ser lidas normalmente, mas depois, virando-a de ponta cabeça lia-se outra história. Isso entre 1903 a 1905, nas páginas do New York Herald. A história tinha o nome de The Upside-Downs of Little Lady Loveking and Old Man Muffaroo, ou O Vira-vira da Lady Lovekins e O Velho Mufaru. De um lado Lady Lovekins, virando a folha, o Velho Mufaru. Para quem desenha é possível imaginar o trabalho de engenharia gráfica que isso exige. Em cada quadrinho, duas explicações lógicas, com desenhos convincentes tanto de uma forma, como de outra: um boneco carregando palha vira um burrinho comendo palha, um pássaro comendo peixe, vira num pescador próximo a ilha. São sacadas geniais de um artista que continua desconhecido por muita gente. Segue um vídeo que mostra o livro lançado nos Estados Unidos em 2009 com a obra de Gustave Verbeek. Na metade do livro aparece outra série feita por ele: The Terrors of Tiny Tads, ou Os terrores dos Tadinhos, onde crianças (tadinhos) estão as voltas com criaturas saídas do pesadelo. Outra genial tirada do artista.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Ana, uma história.

A História em Quadrinhos postada abaixo teve inicio em 1981 e foi até 1983. Os desenhos foram realizados a partir do roteiro/poema de um amigo e refletem o “clima” em que nós, jovens, vivíamos na época. A história tem mais de sessenta páginas, mas somente uma parte foi finalizada. Em 1997 mostrei a parte pronta  ao amigo Barrox, que editava em Atibaia os mais bonitos jornais da região: Luzes da Cidade e Café Expresso. Mais tarde esses jornais passaram a circular também na Praça Benedito Calixto, por ocasião da tradicional Feira de Artesanato Paulista. Quando Barrox voltou a morar em São Paulo carregou as pranchas com a desculpa de realizar com elas uma exposição dos originais. Por determinado tempo perdi seu contato e já tinha até me esquecido do material quando num belo dia chegou pelo correio vários exemplares da História em Quadrinhos impressa. Ele chamou o encarte de Pato com Batom e vinha como suplemento especial do jornal Café Expresso número cinco, de 1999. Foi uma bela homenagem que recebi de um amigo que não está mais entre nós, mas que deixou boas lembranças.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Jayme Cortez, a aventura de um desenhista português em Terras de Santa Cruz.

Nas oficinas de História em Quadrinhos que realizo no Garatuja, uma das primeiras coisas que faço é descondicionar o participante. A grande maioria dos garotos tem o Mangá como única referência. Nada contra, mas conhecer o que se faz, e principalmente o que se fez no Brasil, e no mundo, é fundamental. Aí entra o trabalho de Jayme Cortez. Em qualquer citação sobre a Historia da Banda Desenhada no Brasil, seu nome é um capítulo a parte. Na primeira exposição Internacional de Quadrinhos, que foi realizada  aqui no Brasil em 1951, lá estava ele ao lado de Álvaro de Moya, Syllas Roberg, Reinaldo de Oliveira e Miguel Penteado. Mesmo antes de Roy Lichtenstein pensar em colocar a imagem dos quadrinhos nos Museus, essa turma já fez isso. De Portugal, país onde nasceu em 1926, Jayme Cortez trouxe a experiência para realizar aqui a difícil arte das histórias em quadrinhos, e nisso é considerado “mestre” por importantes artistas que ajudou a formar. É consenso, entre todos que o conheceram, sua generosidade para com outros artistas, principalmente os iniciantes. Sua intenção era que deixassem de copiar os grandes clássicos e desenvolvessem seus próprios estilos. Que o digam Maurício de Sousa, Flávio Colin, Julio Shimamoto e tantos outros. E não foi só nos quadrinhos que Jayme Cortez empregou seu talento. Como artista gráfico realizou inúmeros cartazes cinematográficos. Muitos dos filmes de Mazzaropi tiveram cartazes feitos por ele. Como reconhecimento na área foi instituído, pelo Banco Itaú em 1977, o Prêmio Jayme Cortez para a melhor ilustração de cartaz de cinema. Foi ainda pintor, gravurista, publicitário, professor e autor de quatro livros sobre a técnica de desenho e ilustração. Se não bastasse tudo isso ainda participou, como ator, de propagandas e filmes de Zé do Caixão. Em 1986 Jayme Cortez foi homenageado em Lucca, Itália, com o Prêmio Caran D'Ache, no XX Festival Internacional de HQ e Ilustração, pelos seus 50 anos de atividades. Sua biografia é extensa e melhor que reproduzir suas realizações é indicar o blog que o Fabio Moraes e o Jayme Cortez Filho estão produzindo sobre sua vida e obra  http://jaymecortez.blogspot.com/ . Nota-se nele o carinho e a dedicação com que é realizado, e que só poderia ter sido feito por um fã e admirador de seu trabalho. De lá extraí o link que segue para o vídeo “As Aventuras e Desventuras de um Ilustrador Português em Terras de Santa Cruz”, gentilmente cedido pelo Fabio Moraes. Nele Jayme Cortez não perde a oportunidade de defender o quadrinho nacional. Eterno batalhador da classe, “foi um dos idealizadores do projeto de reserva de mercado para a produção nacional de HQ, reservando dois terços do espaço para artistas locais, que chegou a ser entregue às autoridades, mas nunca implantado”.  http://jaymecortezvideos.blogspot.com/2011/04/gravacao-do-documentario.html .

Revistas de Jayme Cortez no Garatuja
A revista comemorativa A Arte de Jayme Cortez está disponível para consulta, entre outras preciosidades, no Garatuja. Nesta revista tem uma história completa de Dick Peter, o detetive criado por Jerônymo Monteiro, roteirizado por Syllas Roberg e desenhado por ele, em que o herói desvenda o mistério do roubo do Plano Sono X, antes de cair nas mãos de exércitos inimigos. O detetive Dick Peter foi o personagem que inaugurou a literatura policial no Brasil, e Jeronymo Monteiro foi também um dos precursores da Ficção Científica Brasileira, ao lado de meu amigo e conterrâneo André Carneiro. A revista traz ainda um texto curioso sobre como fazer uma história em Quadrinhos publicada originalmente em 1952. Zodiako é outro gibi disponibilizado aos alunos do Garatuja. Para muitos é considerado seu maior trabalho e mereceu elogios até de Moebius. Publicado primeiro na Itália, Zodiako é um herói que concentra as qualidades das doze figuras dos zodíacos, além dos poderes de Hydra e Cetus, e tem como missão enfrentar a tirania representada por um velho Apolo, que começou correto, mas rendeu-se aos encantos do poder, não permitindo a sucessão do novo Apolo (Qualquer semelhança é mera coincidência). Nesse gibi o que chama a atenção é o uso primoroso da técnica de bico de pena e uma paginação incrível. Outra revista do acervo do Garatuja é Saga de Terror, obra póstuma de Jayme Cortez que traz interessante versão da música Coração Materno, de Vicente Celestino. A história leva o nome de Magoou-se, pobre filho meu? ...onde tragédia não falta. Conta o que aconteceu com o camponês que matou a mãe e arrancou seu coração para provar seu amor à debochada amada. Outra versão de música para quadrinhos é Asa Branca, mesmo nome da obra de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, onde Jayme Cortez, através do desenho, nos revela toda tragédia e terror presente na letra. Latir para a Lua é outra versão desenhada de Bark at the Moon, do roqueiro Ozzy Osbourne. Outras duas histórias ao estilo de O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde merecem destaque: Retrato de Jeny e a clássica Retrato do Mal, onde uma pintura é o elo de ligação com as forças do sobrenatural. O acervo do Garatuja conta ainda com outros gibis, com capas de Jayme Cortez realizadas na década de 50, como por exemplo Aventuras Heróicas, da Editôra La Selva.
Márcio Zago

quarta-feira, 25 de maio de 2011

História em Quadrinhos do Lukas


Esse garoto é o Lukas Ryuichi Wada Irie, de 12 anos. A história abaixo ele fez com 11 anos. No primeiro dia que veio no Garatuja, acompanhado da mãe e da tia, não consegui ver seu rosto. Estava literalmente com a cara enfiada num gibi que acabara de comprar. Foi a primeira pessoa que vi andar e ler ao mesmo tempo...esse menino gosta mesmo de história em quadrinhos. Para visualizar melhor sua história, click na imagem.










sábado, 14 de maio de 2011

Concursos, editais e salões de História em Quadrinhos.

Repasso aos interessados e-mail que recebi sobre concursos voltados a História em Quadrinhos e Ilustração: "Temos o prazer de comunicar esta boa notícia. No contexto do Earth Summit 2012 (Rio + 20) está sendo lançado um concurso Crie Futuros em quatro países: iniciativa do Uruguai e mais Brasil, México e República Dominicana. A proposta é criar futuros desejáveis em quadrinhos e ilustrações, com o tema dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Para saber mais vejam o regulamento no link: http://vimeo.com/23660695 . O prazo para entrega é 16 de setembro, premiação em outubro e teremos um evento simultâneo ao Rio + 20 em 2012". Outro evento voltado aos desenhistas é o 38 Salão Internacional de Humor de Piracicaba. O mais tradicional Salão de Humor do Brasil está aberto à participação de artistas profissionais ou amadores que queiram se inscrever nas categorias: cartum, charge, caricatura, tiras e vanguarda. Prazos e maiores informações: www.salaodehumor.piracicaba.sp.gov.br . Outra dica é o edital do PROAC lançado pela Secretaria de Estado da Cultura de SP para publicações de História em Quadrinhos. Dado importante: no mínimo 02 (dois) projetos selecionados serão de proponentes sediados fora da capital do Estado de São Paulo. (Tá mais do que na hora de se pensar em editais específicos para o interior). Serão dez prêmios de R$ 25.000,00 e a inscrição vão até o dia 17 de junho de 2011. Informações: http://www.cultura.sp.gov.br/portal/site/SEC/menuitem.743e24c3aed90ec40fc55410e2308ca0/?vgnextoid=e2d1bb80c43af210VgnVCM2000004d03c80aRCRD&vgnextchannel=4923b23eb2a6b110VgnVCM100000ac061c0aRCRD

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Garatuja, uma girândola de escárnio e fantasia.

Esse era o nome de uma ótima revista em quadrinhos publicada em São Paulo entre 1977 e 1983. Foram um ou dois números experimentais que precederam os quatro oficiais, além de dois pôsteres. O nome da revista me chamou atenção logo de cara e, tempos depois, batizei uma gata que apareceu no atelier com esse nome. A gata não saia de cima dos meus trabalhos e em 1983, quando assumi o Clubinho de Artes e Arteiros de Atibaia, rebatizei o espaço com o nome de Oficinas Garatuja... que hoje é o Instituto de Arte e Cultura Garatuja. Mas voltando a revista: No período em que foi lançada não era comum publicações nacionais de quadrinhos "adultos" com essa qualidade. A revista trazia histórias do editor Luis Fellipe Dias Ferreira, Antônio Carlos Peres, Sérgio Gonzalez e outros, alternadas com fotonovelas, entrevistas e ensaios. Os dois primeiros números tinham formato grande, que foram reduzidos a partir do terceiro e com a novidade da capa colorida na número quatro, embora o miolo, como sempre, continuasse em preto e branco. A Garatuja cinco anunciava uma entrevista inédita com Hergé, o criador de Tintim, mas infelizmente nunca saiu. Hoje essas revistas são raridades e podem ser consultada pelos freqüentadores do Instituto Garatuja.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Pinus

Em 1986 soube que uma Revista de Psicologia faria seleção de novos desenhistas e ilustradores. A revista passava por uma remodelação e a intenção era publicar, todo mes, uma história em quadrinhos na ultima página. Corri e fiz a história que segue. Acho que imaginei o Pinus como um personagem que a cada história dava um fora diferente com sua Psicóloga. (Pensando bem, eles nunca aceitariam essa idéia! rss). A arte final foi feita com canetinha nanquim e a retícula com Decadray (quem se lembra?). Com o desenho embaixo do braço fui para o endereço anunciado. Foi o maior chá de cadeira que tomei na vida. Desanimado, deixei a história com a secretária e nunca mais voltei. Tempos depois, fuçando nas gavetas, achei um xerox desbotado dela. Hoje, graças ao Photoshop, eis o desenho recauchutado. Para visuailizar melhor, click na imagem.


domingo, 8 de maio de 2011

A História da História em Quadrinhos.

Por Márcio Zago

Muito se falou sobre o fenômeno dos quadrinhos. Existe uma vasta bibliografia dedicada ao tema, com pontos de vista as mais diversas, mas alguns livros são fundamentais para entender esse universo. Shazam! é um deles. Publicado na década de setenta, mais precisamente em 1972, esse livro com quase quarenta anos de idade, continua sendo referencia obrigatória pra quem quer conhecer melhor o mundo dos quadrinhos. Seu autor - Álvaro de Moya é um teórico apaixonado pelo que faz. Nesse livro ele conta, logo no inicio, a façanha de ter realizado a primeira exposição de originais de quadrinhos no mundo. É isso mesmo, nem os próprios americanos, que se dizem os criadores do gênero, tiveram essa idéia. E isso aconteceu em 1951, período em que os quadrinhos sofriam grande perseguição. O evento levou o nome de Primeira Exposição Internacional de História em Quadrinhos. Com a recusa do MASP em realizar a exposição, ela aconteceu no Centro Cultura e Progresso, em São Paulo. Nas paredes, originais de Alex Reymond,  Hall Foster,  All Capp, Milton Caniff, e outros.



No Garatuja, além do livro Shazam! tem também A História da História em Quadrinhos do mesmo autor. Este livro, de 1993, traça a trajetória dos quadrinhos, da sua origem até a década de noventa. Há muitas referencias visuais, e por isso mesmo acho que merecia ser atualizado e novamente editado, num formato livrão...cheio de páginas coloridas. Em 1996, Álvaro de Moya esteve em Atibaia por conta de um projeto da Secretaria de Estado. O evento aconteceu na Biblioteca do Alvinópolis e se estendeu por vários dias. Alem da palestra com Álvaro de Moya aconteceu uma mostra de painéis didáticos sobre o tema, exposição de gibis, oficinas e sessões de vídeos comentados.  Dias desses, navegando pela internet, descobri um curta metragem que ele realizou com Rogério Scanzerla em 1969. Rogério Scanzerla  é o diretor do clássico O Bandido da Luz Vermelha, de 1968. Filme considerado o mais representativo do chamado Cinema Marginal e tem uma linguagem narrativa própria das histórias em quadrinhos. Tive a oportunidade de ver O Bandido da Luz Vermelha pela primeira vez somente na década de oitenta, quando ajudava a operar um projetor 16 mm no cineclube da cidade...oh saudade.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Apresentação - O Baú do Garatuja

O Baú do Garatuja também poderia ser o nome desse blog. Os alunos mais antigos certamente se lembrarão do velho baú repleto de gibis que por longo tempo mantive no atelier. Para muitos jovens e crianças que passaram pelas oficinas esse foi o objeto mais interessante do espaço. Embora adorado pelos alunos, eu sentia certa resistência e desconfiança por parte de alguns pais. Talvez vissem ali um desvio da proposta inicial, que era pagar uma mensalidade para que seus filhos aprendessem a desenhar e pintar. Como nessa época eu vivia exclusivamente das mensalidades, achei por bem "esconder" o tal baú, guardando em outro local. Passei então a apresentar os gibis de maneira mais seletiva, de acordo com a ocasião, mas nunca deixei de utilizá-los como importante estímulo ao desenvolvimento e aprimoramento estético. Nesta época (anos oitenta) eu tinha acabado de descobrir os quadrinhos americanos e europeus importados, nada fáceis de encontrar. Atibaia era uma cidade pequena, provinciana, com poucas bancas de jornal. Lembro-me que havia somente a Banca do Barqueta e da Rodoviária. O material que chegava eram as publicações mais comerciais: Disney, Maurício de Souza, Super-Homem, Batman, Pimentinha, Brotoeja, Luluzinha, etc. Esse encontro com os quadrinhos artísticos foi casual, numa banca de jornal da Avenida Paulista, de propriedade de João Zero (o nome me marcou). Foi lá que conheci a revista Heavy Metal. Folhear essa revista foi como abrir uma janela... Arrebatador! É bom lembrar que na época não havia a internet e para conhecer uma revista nova, somente tendo-a em mãos. A Heavy Metal é uma revista americana, que na época era vendida a preço de ouro (pelo menos para mim, que vivia duro). Como patino no idioma, comprava com muito sacrifício e ficava admirando os desenhos... E que desenhos! Enki Bilal, Phillippe Caza, e para mim o melhor deles : Moebius. Depois dela fiquei muito mais exigente e passei a comprar todos os gibis que me tocavam pelo visual, só depois lia as histórias.  A Heavy Metal foi bastante arrojada para a época, com temática futurista, voltada a fantasia e a ficção científica, com desenhos expressivos e tratamento gráfico impecável. Uma surpresa para mim. Pela janela aberta pela Heavy Metal conheci os quadrinhos de qualidade e com elas passei a encher meu baú. Mantenho muitas delas até hoje, embora tenha me desfeito de verdadeiras preciosidades. Houve uma época em que achei melhor passar meu acervo para os amigos "gibizeiros" imaginando que fariam melhor proveito... Uma burrada. Com isso me desfiz das melhores peças, mas não faz mal, algumas consegui de volta e outras procuro até hoje, mas ainda sobrou muita coisa. Com o tempo a coleção aumentou e hoje tenho um acervo bastante representativo do que de melhor se produziu aqui no Brasil e lá fora. É com este material que pretendo alimentar esse blog, muito com a intenção de despertar o interesse e a curiosidade nos alunos da nova geração e quem sabe... Abrir janelas.

Márcio Zago